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18 de out. de 2014

Meu artigo foi aceito em um evento e não foi aceito em revista: Por quê?

Por diferentes motivos. Você pode não concordar, você pode reclamar, você pode espernear mas o fato é que alguns artigos seus podem eventualmente não ser aceitos para publicação em revista alguma.

O primeiro deles é explicado pela prática da comunicação científica: eventos são usados para apresentação de papers em suas versões preliminares e pesquisadores utilizam as discussões realizadas em eventos para afinar a técnica e aprimorar os resultados das pesquisas enquanto que revistas veiculam trabalhos que são chamados de publicações permanentes, ou seja, versões de trabalhos que são considerados acabados (se é que esse bicho existe).

Diante disso talvez seja necessário você publicar o mesmo artigo em mais de um congresso até que ele esteja apto a ser veiculado por uma revista. Esta prática incomum no Brasil é bastante tradicional no exterior. O pesquisador brasileiro Rodrigo Verdi, do MIT, costuma apresentar seus papers em média em 3 eventos antes deles serem publicados em periódicos com alto fator de impacto.

No Brasil, até recentemente todos os eventos científicos sobre a temática contábil exigiam ineditismo para os trabalhos, ou seja, cada artigo poderia ser apresentado em uma única conferência antes de ser enviado a um periódico. Esta situação mudou recentemente quando, em 2014, o Congresso USP de Controladoria e Contabilidade passou a aceitar a submissão de artigos já apresentados em outros eventos com a orientação de que o trabalho tivesse passado por melhorias.

Possivelmente essa é uma tendência que vá se espalhar entre outros eventos da área.

Um segundo motivo para que um artigo aceito em evento não seja aceito em periódicos é o fato de que eventos veiculam mais artigos do que as revistas podem absorver. Enquanto é muito comum que revistas brasileiras de Contabilidade, em sua maioria tri ou quadrimestrais, veiculem menos de 20 artigos por ano, eventos veiculam até algumas centenas de papers em uma única edição.

Cruz, Machado, Martins e Rocha (2011) afirmam que a taxa de conversibilidade de artigos publicados nas edições de 2001 a 2010 do Congresso USP de Controladoria e Contabilidade foi de aproximadamente 15%. Bernardes, Borba e Ferreira (2014) analisaram a publicação em língua inglesa entre 2000-2012 dos docentes dos programas de pós-graduação em Contabilidade. A taxa de conversão apontada pelos autores foi de aproximadamente 47%. Santos, Schmitz e Faveri (2014) que analisaram a conversão dos artigos publicados entre os anos de 2007 a 2012 no EnAnpad, Anpcont e Congresso USP de Controladoria e Contabilidade encontraram uma taxa de conversão de aproximadamente 40%.

Já Espejo, Azevedo, Trombelli e Voese (2012) fizeram o caminho inverso e analisaram a origem dos artigos publicados nas 15 revistas mantidas por programas de pós-graduação stricto sensu em Contabilidade em 2009 e 2010 e verificaram que aproximadamente 55% dos artigos foram apresentados a priori em eventos e 20% tinham origem em teses, dissertações e monografias de graduação.

A despeito das taxas de conversão mostradas acima ainda pode-se fazer um cálculo simples: quantos artigos cada programa de pós-graduação em Contabilidade apresentou em congresso e publicou em revista do último triênio:

Fonte: Relatório da trienal 2010-2012

Faz-se uma ressalva nessa análise pois ela trata de um índice de publicações de revistas / apresentações em eventos e não uma taxa de conversão mesmo porque os artigos publicados em revistas em 2010 provavelmente são oriundos de pesquisas realizadas no triênio anterior e os artigos apresentados pelos programas em 2012 provavelmente só foram publicados em revistas no triênio seguinte.

Mas mesmo assim, o índice mostra que é usual se apresentar mais artigos em congressos do que publicar em revistas e que esse fenômeno acontece em muitos programas.

Referências

Bernardes, É. M., Borba, J. A., Ferreira, D. D. M. (2014). Produção científica em língua inglesa dos docentes dos programas de pós-graduação em Contabilidade no Período de 2000 a 2012. Disponível em: http://dvl.ccn.ufsc.br/congresso/arquivos_artigos/artigos/937/20140425102249.pdf. Acesso em: 18 out. 2014.
Cruz, A. P. C. D., Machado, E. A., Martins, G. D. A., & Rocha, W. (2011). Da pesquisa em construção à publicação definitiva conversão da produção científica no campo da contabilidade (2001-2010). Disponível em: http://www.congressousp.fipecafi.org/web/artigos112011/328.pdf. Acesso em: 18 out. 2014.
Espejo, M. M. S. B., Azevedo, S. U., Trombelli, R. O., Voese, S. B. (2012). Crise de Identidade? Uma proposta existencialista para eventos científicos na área de Contabilidade. Disponível em: https://www.furb.br/especiais/download/328124-184436/EPC%20115.pdf. Acesso em: 18 out. 2014.
Santos, V., Schmitz, T., Faveri, D. B. (2014) Conversão dos artigos socializados em eventos em publicações de periódicos. Disponível em: http://www.furb.br/_upl/files/especiais/anpcont/2014/159_3.pdf?20141011051504. Acesso em: 18 out. 2014.

11 de out. de 2014

O que aprendi submetendo artigos para revistas

Decidi colocar este post para sintetizar o trabalho de publicação de artigos que desenvolvi de 2010 a 2014. Em 2010 criei um sistema de acompanhamento bastante simples de submissão de artigos no qual controlava a revista e a data em que o artigo foi submetido e posteriormente a aprovação ou recusa pela revista.

Nesse sistema inclui 32 artigos e dois deles ainda se encontram em avaliação. Com os demais 30 artigos aconteceu o seguinte: 20 foram aceitos para publicação na primeira revista enviada, 4 foram aceitos na segunda revista, 4 na terceira revista e 2 na quarta revista.

Penso que de todos eles apenas uns três foram aceitos sem que o editor pedisse qualquer alteração o que indica que receber recomendações de alteração são muito comuns. É interessante verificar a dinâmica das recusas em função do estrato Qualis das revistas:
1. Recusado em: B3.                          Aprovado em B3.
2. Recusado em: B1.                          Aprovado em B5.
3. Recusado em: B1.                          Aprovado em B4.
4. Recusado em: B3.                          Aprovado em B5.
5. Recusado em: B2 e B1 .                Aprovado em B4.
6. Recusado em: B1 e B1 .                Aprovado em B1.
7. Recusado em: B3 e B1 .                Aprovado em B5.
8. Recusado em: C e C .                   Aprovado em C.
9. Recusado em: B2, B1 e B3.          Aprovado em B4.
10. Recusado em: B1, B1 e B1.        Aprovado em B2.

Acho que o caso 1 e 6 são os mais interessantes: ambos foram reprovados e depois foram aprovados por revistas do mesmo estrato Qualis. O que isso indica? Que a pesquisa é ruim? Que não tem contribuição? Que não merece ser publicada? Que a revista seguinte estava equivocada em aprovar o artigo? Talvez. Talvez essas questões filosóficas sejam a resposta.

Ou talvez essa questão seja respondida com respostas mais operacionais. Talvez o editor estivesse com um estoque de artigos muito grande para publicar e tenha recusado com um "este artigo não pertence ao escopo desta revista¹". Talvez o editor não goste do tema, dos autores ou da instituição dos autores e escolha avaliadores extremamente rigorosos ou incoerentes que certamente reprovarão o artigo. Ou talvez o artigo tenha um tema tão fora do mainstream que força o editor a enviar para avaliadores que não tem competência para avaliar o tema do artigo e reprovam com um "o artigo não traz qualquer contribuição para a área¹" ou "este artigo não é científico¹". São fatos como esses que podem originar os pareces tão contraditórios como apontados por Martins (2007).  

Diante do exposto, me vejo inclinado a ter a mesma dúvida apresentada por um pesquisador entrevistado por Paulo Pegino em sua tese:

“Ou você toma a pílula azul ou a vermelha. Se você tomar a pílula azul, você vai continuar vivendo o Matrix. O que é viver no Matrix? 'Olha, eu tenho que me adequar ideologicamente a esse journal para poder publicar, ter meu emprego e viver minha vida feliz.' Se você tomar a pílula vermelha, você vai dizer: 'Vai pra puta que pariu todo mundo, eu vou publicar nesse journal aqui que o impact factor é 0, mas é o journal que aceita minhas idéias malucas, que é contra todo o sistema.' Ótimo, então você vai viver de incenso. Você tem as escolhas da vida. Você dizer para um jovem tomar a pílula vermelha é muito difícil. Na ciência sempre foi assim, ou seja, há uma reprodução desse negócio. Pra você entrar no sistema, você se submete a isso. E aí, o que acontece? Quando você for mais velho, aí você se revolta contra o sistema, porque você já tirou o brevê do avião, entendeu? Aí você já é alguém com autoridade pra dizer: 'Olha, isso aqui tudo é uma merda.' Mas, até lá você é um Zé Ninguém, você não vai poder fazer nada, você vai espernear sozinho, entendeu? (PESQUISADOR 3).” (Pegino, 2014, p. 282).

Martins, G. A. (2007). Avaliação das avaliações de textos científicos sobre contabilidade e controladoria. Revista de Educação e Pesquisa em Contabilidade (REPeC), 1(1), 1-13.

Pegino, P. M. F. (2014). As relações acadêmicas de produção na pós-graduação em administração no Brasil. Disponível em: http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/11851/TESE%20Paulo%20Ferraresi%20Pegino.pdf?sequence=5. Acesso em 10 out. 2014.

¹Trechos extraídos de pareces de artigos recusados e posteriormente aceitos para publicação.